Sindicato de escolas particulares propõe que volta às aulas no Ceará seja com ensino híbrido

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Escolas da rede privada de ensino do Ceará defendem que o retorno das aulas presenciais ocorra na próxima segunda-feira, dia 20, para parte dos estudantes. A ideia do sindicato que representa as instituições é que a volta seja gradual e baseada no “ensino híbrido”, ofertando aos pais as opções de manterem os filhos em casa ou mandá-los à escola.

A data, porém, segue sem confirmação pelo Governo do Estado, e é desaprovada por parte dos pais e profissionais.

As atividades presenciais em escolas, cursos, faculdades e universidades públicas e privadas estão suspensas no estado desde março, e já tiveram possíveis datas de retorno adiadas pelo poder público. O Sindicato de Educação da Livre Iniciativa do Ceará (Sinepe) enviou ao Governo do Estado, em junho, um protocolo com medidas de segurança sanitária.

Fortaleza está na segunda semana da terceira fase do plano de retomada. Nesta segunda-feira, barracas de praia foram autorizadas a reabrir.

O G1 contatou a Secretaria da Saúde (Sesa) para saber quais as recomendações da pasta para a volta às aulas e se há previsão de data, mas não obteve retorno.

A presidente do Sinepe, Andréa Nogueira, resume que “as propostas do protocolo têm duas bases: o cuidado com a higienização pessoal e dos espaços; e o distanciamento físico”, e garante que “as escolas da rede privada estão preparadas para a retomada das aulas presenciais no dia 20, mas estão enviando questionários para saber a opinião dos pais”.

Além do protocolo sanitário, um plano de retomada foi elaborado pelas instituições. Uma das principais ideias é a do retorno escalonado das turmas ao ambiente físico. “Sugerimos às escolas que retornem com o ensino híbrido, ou seja, deem opção aos pais de escolherem se o filho vai voltar às aulas presenciais ou continuar com as remotas”, afirma Andréa, analisando que “muitos pais precisam voltar ao trabalho e não têm onde deixar os filhos”.

Somadas às medidas de saúde física, o protocolo orienta que as instituições programem atividades de acolhimento, respeitando o distanciamento físico, para “identificar a apoiar crianças e adolescentes em estado de sofrimento emocional”, por morte na família, perda de renda, impactos do isolamento ou até violência doméstica.

Outra recomendação do Sinepe às escolas é que todos os funcionários sejam vacinados contra gripe, “a fim de prevenir ocorrências de influenza que podem ser confundidas com a infecção pelo novo coronavírus”.

‘Duas rotinas’
Desde que teve de voltar ao trabalho presencial, a engenheira civil Clarissa Maciel, 30, precisa deixar a filha de 6 anos sob os cuidados da madrinha, já que a escola privada onde a menina estuda em tempo integral permanece fechada. Mesmo com dificuldades para dar suporte à pequena nas aulas remotas, Clarissa discorda do retorno.

“A escola dela disse que vai voltar no dia 3 de agosto. A diretora me explicou todas as medidas de higiene e cuidados, mas não me sinto segura. Minha filha iria só por dois dias na semana, porque os alunos vão revezar, mas a relação risco-benefício pra mim não está fechando. As crianças vão passar o dia juntas, e não sei como os outros pais estão respeitando as medidas de isolamento”, destaca.

O revezamento entre idas à escola e aulas online, para ela, torna ineficazes a prevenção da Covid-19 e a recuperação do aprendizado. “Com essa ida em apenas dois dias, seriam duas rotinas diferentes pra gente administrar. Não tem garantia de que isso melhore a produtividade das crianças, o aprendizado, porque de qualquer forma passariam um período em casa. Atividades remotas são mais difíceis, complicadas, mas acho que vale o sacrifício, nesse momento”, finaliza.

Escolha
A autônoma Ranyelle Pereira, 24, saiu do emprego como cuidadora hospitalar para ficar com o filho, na pandemia. “As aulas online, pra gente, não deram muito certo. Uma criança de 3 anos não vai ficar entretida na frente de um celular, computador, por muito tempo. Na escola dele, a previsão é voltar em agosto, mas não sei se eu vou mandá-lo. Quando tudo isso passar, vou pensar. Até então, tô em casa com ele”, frisa.

A doutora em Educação e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC) Jakeline Alencar reconhece que as famílias vivem, hoje, um dilema: cumprir a obrigatoriedade legal de manter filhos de 4 a 17 anos matriculados na escola ou garantir a segurança deles. Ainda segundo a pesquisadora, “muitos pais têm questionado a qualidade e a eficácia das atividades do ensino remoto”, o que requer mais cautela das instituições públicas e privadas no retorno.

“As crianças estarem na escola simboliza, pra toda a sociedade, um aspecto de normalidade. Talvez por isso a insistência de não parar as atividades. Mas para retomarmos o ensino, seja híbrido ou presencial, precisamos considerar o que esperávamos que as crianças aprendessem, repensar as avaliações”, analisa a professora.
Ela pondera, ainda, que a “perda do vínculo das crianças com a comunidade escolar” gera déficits “não só cognitivos, mas afetivos”.

Elnatan de Oliveira, promotor de Justiça e coordenador do Núcleo de Defesa da Educação do Ministério Público do Estado (MPCE), garante que o órgão vai fiscalizar as escolas públicas e privadas, quando houver retorno, a fim de verificar se as medidas sanitárias estão sendo adequadamente aplicadas. “A perspectiva é que as aulas retornem em algumas escolas privadas e na rede pública no dia 27 deste mês. Mas como houve aumento de casos no interior, estamos reticentes. Vamos acompanhar”, afirma.

Cancelamento de matrículas
Ao fim de junho, escolas particulares ligadas ao Sinepe registravam perda de cerca de 14% das matrículas, no período da pandemia, segundo a entidade; levantando questões sobre a obrigatoriedade de manter na escola crianças e adolescentes de 4 a 17 anos.

A secretária-geral da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB/CE, Rebeca Bedê, destaca, porém, que o “abandono intelectual” (artigo 256 do Código Penal) não se aplica ao atual contexto. “O artigo é uma reprovação social a pais que se omitem do dever de promover a educação – e não é o caso. Estão tirando os filhos da escola por medo de contaminação”, pontua.

A professora Jakeline Alencar destaca que as dificuldades econômicas impostas pela pandemia acendem a discussão: “nesse momento, será que todos têm condições de manter seus filhos na escola, mesmo sendo obrigação legal?” A pesquisadora aponta ainda que se, por um lado, algumas famílias “conseguiram se adaptar à rotina e acompanhar a escolarização remota dos filhos”, muitos pais “não se adaptaram” à nova realidade.

Rede pública
Nas escolas estaduais e municipais, o impasse também persiste. Em decreto publicado no dia 14 de junho, a Prefeitura de Fortaleza manteve a suspensão das aulas presenciais em estabelecimentos de ensino da rede pública municipal até 31 de julho de 2020; e na rede privada, até 19 do mesmo mês. Nenhuma das datas foi confirmada pelo poder público, até agora.

De acordo com a Secretaria da Educação do Ceará (Seduc), que gere escolas estaduais, “o processo de retomada das aulas presenciais está sendo elaborado” de modo a analisar “todas as possibilidades que se mostrarem viáveis para evitar prejuízos ao processo de aprendizagem dos estudantes”. A Pasta garante que “antes de ser colocado em prática, o Plano de Retomada das Atividades Presenciais será submetido à avaliação da comunidade escolar” e seguirá orientações da Sesa.

Em reunião do Comitê Consultivo Estadual no último dia 24 de junho, a Seduc apresentou proposta de retomada das atividades presenciais da rede pública com previsão para agosto. A secretária Eliana Estrela alertou, contudo, que a confirmação “depende da determinação dos especialistas da saúde”.

Com informações do G1