Treze policiais civis do Ceará alvos da Operação Vereda Sombria, com a primeira fase realizada pela Polícia Federal em dezembro de 2017, foram condenados pela Justiça Federal do Ceará. Cabe recurso da decisão. Dos condenados, 12 são inspetores e uma delegada. A Justiça Federal também decidiu que 11 deles devem perder o cargo público.
A investigação que culminou na Operação Vereda Sombria aconteceu a partir de uma delação premiada. No ano de 2016, o traficante português Carlos Miguel de Oliveira Pinheiro relatou que teve bens subtraídos por policiais civis da Divisão de Combate ao Tráfico de Drogas nos dois episódios nos quais foi preso.
Os policiais sentenciados foram: Antônio Chaves Pinto Júnior, José Audísio Soares Júnior, Thales Cardoso Pinheiro, Victor Rebouças Holanda, Fábio Oliveira Benevides, Raimundo Nonato Nogueira Júnior, Antônio Henrique Gomes de Araújo, Francisco Alex de Souza, Rafael de Oliveira Domingues, João Filipe Araújo Sampaio Leite, Allan Wagner de Oliveira, Patrícia Bezerra de Souza Dias Branco e Petrônio Jerônimo dos Santos.
O português chegou a ser preso por vender anabolizantes vindos da Europa. Diante da delação premiada, o MPF encaminhou a investigação do caso à PF, que realizou interceptações telefônicas legalizadas e acompanhou as negociações do esquema criminoso.
Envolvimento
Dentre os crimes apontados pelo Judiciário estão corrupção, extorsão, tortura, apropriação de dinheiro público, abuso de autoridade e organização criminosa. A sentença varia conforme o grau de participação de cada um dos réus nas ações. Os únicos que não devem perder cargo público são Thales Cardoso e Victor Rebouças.
Patrícia Bezerra era delegada titular da DCTD quando foi alvo da primeira fase da operação. A policial foi condenada pelo crime de organização criminosa. A pena é de sete anos de reclusão, perda do cargo e interdição para o exercício de função ou cargo público pelo prazo de oito anos subsequentes ao cumprimento da pena. O regime designado na sentença foi o semiaberto.
De acordo com o advogado Leandro Vasques, representante da defesa de Patrícia Bezerra “a defesa técnica da delegada Patrícia Bezerra comprovou fartamente, durante a instrução processual, através de fortes provas documentais e testemunhais, a completa improcedência da acusação”.
“Confiamos plenamente que o Tribunal Regional Federal reformará esta sentença e absolverá a delegada Patrícia Bezerra. Além disso ainda não descartamos a possibilidade do processo ser todo nulo, uma vez que entendemos que a Justiça Federal não é a competente para apurar o presente caso”, afirma.
Outros dois delegados lotados na DCTD foram alvos da operação. No entanto, a Justiça decidiu pela inocência de Lucas Saldanha Aragão (à época diretor adjunto da Especializada) e Anna Cláudia Nery.
Demais defesas
O advogado Kaio Castro, que representa a defesa da maior parte dos acusados, acredita que “a sentença tem caráter arbitrário e injusto, afinal o juiz precisou de quase dois anos do processo concluso para julgar. Se tivesse prova robusta não precisaria de tanto tempo e esforço”.
Em nome dos inspetores condenados Antônio Chaves Pinto Júnior, José Audízio Soares Júnior, Fábio Oliveira Benevides, Raimundo Nonato Nogueira Júnior, Antônio Henrique Gomes Araújo, Francisco Alex de Souza, João Filipe de Araújo Sampaio Leite e Petrônio Jerônimo dos Santos, o advogado Kaio Castro afirmou que “a instrução criminal ainda foi pautada no cerceamento de defesa”.
Segundo Castro, “ao longo desses dois últimos anos a defesa compartilhou novas provas que sequer foram analisadas no julgamento, foram ignorados princípios constitucionais em uma verdadeira demonstração de arbitrariedade afastando o juízo de convicção. Outra questão que precisa ser colocada é que vimos argumentos pessoais sendo colocados ao invés de argumentos jurídicos. A utilização distorcida da responsabilização penal provoca efeitos nocivos a democracia, e no caso quem mais perdeu com isso foi a sociedade, pois hoje o crime organizado bate palmas para essa sentença”.
Bruno Queiroz, representante da defesa do inspetor Rafael de Oliveira Domingues, destacou que irá recorrer da decisão por entender que o juiz não observou as verificações na instrução: “O Rafael só foi apontado em uma terceira ação, e mesmo nela não há indicativo de participação no crime contra o português. Rafael nunca participou de organização criminosa”, disse.
Renan Benevides, advogado de Allan Wagner de Oliveira, disse ainda analisar a sentença, mas que certamente irá recorrer, por entender que o representado é inocente. A defesa de Thales Cardoso Pinheiro, representada por Delano Cruz, também afirmou que irá recorrer da decisão e tem expectativa de absolvição. O advogado de Victor Rebouças Holanda não foi localizado pelo G1.
Processo
Em um dos trechos da sentença assinada pelo juiz Danilo Dias Vasconcelos de Almeida, da 32ª Vara Federal, o magistrado destacou que o processo “descortinou a existência de uma organização criminosa dedicada ao cometimento sistemático de crimes por parte de policiais civis, boa parte destes com uso de violência ou grave ameaça. A ocorrência de tortura no âmbito da delegacia a que vinculados os réus não se mostrou algo pontual, mas sim situação recorrente”.
Conforme a decisão, há fortes indícios de outros crimes cometidos pelo grupo, estes de competência da Justiça Estadual. Sobre Patrícia Bezerra, o juiz Danilo Dias disse ainda nos autos não ter dúvidas que enquanto delegada a acusada “tinha pleno conhecimento dos inúmeros abusos policiais praticados no âmbito da delegacia da qual era titular – tendo, inclusive, participado de parte deles”.