Convido os amigos leitores a adentrar no universo deste encanto, desta poesia incomparável que encontramos nestas pessoas.
Como podemos defini-los? Cronistas do cotidiano quixadaense, trovadores, repórteres ou serão poetas da terra dos monólitos? Suas presenças são necessárias, pois, na verdade, eles são as almas das ruas. Eles também fazem história e não podem ser esquecidos. Apesar do crescimento da cidade, ainda podem ser encontrados estas figuras únicas. Aqueles que já partiram ainda estão presentes em nossa memória. Se faz necessário lembrar que ganha status de tipos populares não apenas aqueles que apresentam algum tipo de comportamento estranho, mas também os que se destacam nas suas atividades profissionais atraindo para si um grande número de admiradores.
Para um bom começo de conversa, devo afirmar aos caros brechadores de minha coluna que a lista destes vultos é enorme e somente com a ajuda de vocês, poderemos melhorar este despretensioso artigo cujo objetivo é apenas tentar não deixar desaparecer um pouco da memória do que podemos chamar de geografia humana quixadaense.
Convido os amigos leitores a adentrar no universo deste encanto, desta poesia incomparável que encontramos nestas pessoas. E para nossa alegria, Deus sempre nos presenteia com novos tipos populares e tem sempre um quebrando a casca do ovo. Quem esquece Zé Laranjeiras, o filósofo popular que desafiou a Ciência ao afirmar que só acredita no peso da terra apresentada pelos estudiosos se a ele fosse mostrada a balança que pesou nosso planeta.
Não sai de nossas lembranças o querido Almeidinha que abraçava todos os aniversariantes do dia e não perdia um só enterro. E o Olho de Bila que botava muitos estudantes para correr, mas só quando o incomodavam e era bem inteligente, muitas vezes realizando bonitos desenhos e falando fatos de nossa história. A renomada escritora quixadaense Angélica Nogueira a ele se referia como “o monstrinho agradável”.
Impossível esquecer o Zé do Saco e seu irmão Ferrugem que foi assassinado na sua própria casa na Pedra do Cruzeiro. E aquela bela figura do engraxate Pé de Lapa que com sua possante voz trovejava “Vai uma graxa, cidadão?”. Sempre Serve gabava-se que nunca havia tomado banho.
O “Bom Legal” que cumprimentava a todos com a saudação que lhe deu o apelido, mereceu até uma homenagem do empresário Hélder Lopes que colocou o nome “Bom Legal” em um de seus empreendimentos. Os de mais idade lembram a divina presença daquela senhora que fazia caretas para receber um trocadinho. Luzia de Pinho foi imortalizada ao dar nome a uma de nossas ruas.
Quixadá tinha o melhor esgotador de fossas deste mundo (o exagero é por minha conta) que era o Pé de Aço. Ganhou nome, ficou famoso na cidade. Alô Pé de Aço, aí no céu, vem dar uma ajuda para limpar nossa suja cidade! E vovô Bananeira, o terror dos maridos de primeira viagem a quem tratava(na verdade, brincava) chamando os de “cornos”.
Tudo brincadeira num Quixadá alegre, onde todos se conheciam e eram amigos. Cabra Namorador deixou muitas devotas de Santo Antônio em pânico e foi morar no céu em 2013. Na sua banca de café, por detrás da Catedral, José Maria(seu verdadeiro nome) fez muitos amigos e fãs. E aquela idosa que ao se aproximar do monumento ao trabalhador na praça da estação, se ajoelhava e começava a rezar baixinho? Não sabíamos seu nome e apenas a tratavam como “dona Graúna”.
Outro tipo popular que deixou marcas foi Luís Chibata com sua grande irreverência e o fato de ter colocado em todos os seus filhos, nomes de presidentes da República.
Tudo isso verdade, amigos! Naquele belo Quixadá parecia que tínhamos obrigação de ser felizes. E éramos ao conviver com esses seres iluminados. A dona Bela percorria as ruas da cidade e até cantava uma canção da Aracy de Almeida por um almoço dos bons. Tinha um carinho todo especial pela família do Senhor Qunizinho, onde sempre encontrou solidariedade. Bastante popular foi também o Manchão que exercia as mais diversas profissões como carreteiro, lixeiro e se destacava dos demais, pelo fato de sempre carregar uma enorme mala na cabeça e um enorme saco nos ombros. Uma senhora já com uma certa idade que namorava com quase todo mundo(sempre aumentam a realidade nas cidades do interior) ganhou o apelido de Rural, quer dizer, vitalina(envelheceu, nunca casou), atrás de príncipes encantados. Como esquecer o Batoque, o Sebastião, Pedro, Augusto, Teresa, todos tidos como doidos? Como não lembrar o Zigago, Raimundo Padeiro, Croinha carreteiro? Mas, graças aos santos protetores dos tipos populares essa poesia oriunda dessas pessoas iluminadas, continua a brotar nas nossas praças e ruas.
Quixadá passou por muitas transformações nos últimos anos, mas não fez desaparecer por completo essas figuras, ao contrário de outros lugares, onde elas não mais existem. Quer dizer, nossos espaços continuam com alma, com vida. Aqui na terra dos monólitos ainda não soou o toque de recolher para essa gente. Querem ver? Se em Fortaleza tinha a banca do Bodinho, aqui nós temos a famosa banca do Milton Barbosa que é um símbolo da Praça José de Barros.
Raimundo Lima chegou a ser comparado ao famoso Lunga lá do Crato, pois sempre tem uma resposta pronta para perguntas, digamos, desnecessárias. Os quixadaense sabem daquele fora que Raimundo deunuma freguesa (ele também é comerciante) que pretendia comprar um rádio para ouvir cantorias. Ao falar que não gostava de Raimundo cantando, então, não mais conseguiu adquirir o aparelho. Ir a Quixadá e não provar dos saborosos churros de Candinho é um passeio incompleto. Candinho é uma figura muito popular e querida na cidade. Chico das Antenas ganhou notoriedade pelo fato de ser um dos pioneiros na montagem desses equipamentos na terra dos monólitos que a partir dos anos 70(século passado) começou com a sua explosão urbana. Pedão da Água Boa é um ídolo na cidade e quando sua carroça tricolor se aproxima de alguma casa, as crianças anunciam: “Mamãe, chegou o Pedão da água boa”.
Este artigo é apenas um “mote” que lançamos e propomos aos interessados em conhecer , com profundidade, estes atores considerados como secundários de nossa história que não podem ser esquecidos. E que também, quem sabe, possa servir de reflexão para que os registros do cotidiano não sejam apenas de pessoas pertencentes à elite da cidade. Se estas mal traçadas linhas contribuírem de alguma forma para a memória da terra dos monólitos ficarei muito feliz. E mais feliz ficaria ainda se nossos tipos populares merecessem um registro mais contundente feito pelos nossos historiadores.
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