Coluna Amadeu Filho: Carroceiro quixadaense participou da segunda Guerra Mundial

compartilhar no:

guerra-QuixadaaAAA

Dezinho morreu no dia 20 de setembro de 1998, deixando tristes familiares, amigos e uma história anônima.

Preferia morrer que matar. Achava que não deveria atirar em ninguém. “Não foi isso que mamãe me ensinou”. O depoimento do quixadaense José Ferreira Filho, conhecido como Dezinho, foi dado há alguns anos, mostra o grande despreparo dos brasileiros nos campos de batalha na Itália, durante a Segunda Guerra Mundial. O jovem quixadaense, assim como os demais, não tinha muito ideia porque estava naquela guerra, muito distante de seu querido Quixadá, não sabia exatamente a motivação daquele combate. “Eu tinha medo de matar as pessoas”, afirmou muitas vezes. Frio, muitas vezes enrolados em jornais, falta de higiene, comida ruim, lama, campos minados (que não sabíamos de sua existência), tudo isso fez parte do dia-dia de Dezinho e dos outros pracinhas (termo referente aos soldados brasileiros que foram enviados para integrar as forças aliadas contra o nazi-fascismo na Segunda Guerra Mundial).

O grande conflito mundial, o mais abrangente da História se guerra-Quixadadeu entre os anos de 1939 a 1945. Estimativas sugerem que mais de 60 milhões de pessoas tenham morrido nesta guerra. Segundo a maioria dos historiadores, a posição de neutralidade do Brasil durou até 1942, quando algumas embarcações brasileiras foram afundadas por submarinos alemães no oceano Atlântico. O presidente Getúlio Vargas fez um acordo com o governo norte-americano e assim, nosso país entrou na guerra ao lado dos aliados (Estados Unidos, Inglaterra, França, União Soviética). Muitos estudiosos do assunto condenam até os dias de hoje, esta decisão do governo brasileiro. Apesar de vitórias, centenas de soldados brasileiros perderam a vida em combate. Na dura batalha de Monte Castelo, cerca de 400 brasileiros foram mortos.

No começo da década de 40, aquele jovem recebia ainda conselhos de Seu Júlio de como se tornar um grande carroceiro. Chegou então à idade do serviço militar e Dezinho serviu no vigésimo terceiro batalhão de caçadores em Fortaleza, durante um ano. Era o ano de 1941 e cumprido o tempo, voltou para Quixadá. Mas quando foi pegar o certificado militar foi comunicado que havia sido convocado para lutar na Itália, junto com outras cearenses. A notícia deixou a esposa Maria Araújo e toda a família muito triste. Depois de dois meses no Rio de Janeiro, embarcou para terras italianas. Foram 25 mil brasileiros.

Nas montanhas da Itália, o jovem voltava seus pensamentos para a sua querida Quixadá. Trabalhar na carroça do seu mestre Júlio Carroceiro; os passeios ao açude Cedro, nos domingos, pegando frutas no caminho; conviver com os amigos Caboclo, armando do Brasília e seus colegas de trabalho; ver o filhinho que ainda estava na barriga da mãe, pois queria acompanhar seu crescimento, ensinar-lhe a ser carroceiro, a fazer o bem! E o restante da família, como estava? Naquele relevo montanhoso, tão estranho, quando possível, à noitinha, junto com outros pracinhas, uma oração improvisada, curta, mas eterna. Sofria ao ver jovens como ele, tombados naquela terra estranha.

Dezinho contava que apesar das dificuldades e da falta de experiência, os pracinhas conquistaram vitórias ao lado de soldados aliados. Fazia questão de citar Turim, Monte Castelo e Montese. Terminado o sangrento conflito, foi às lágrimas ao ser comunicado que ele e os seus colegas retornariam ao Brasil. Contou-nos que a história quase não registra o fato, ao saberem da notícia, todos se abraçavam, brasileiros e soldados de outras nações.

Desembarcando no Rio de Janeiro, contava as horas de voltar para a terra que tanto amava. Interessante que ao desembarcar no porto do Cais, em Fortaleza, não fora reconhecido de imediato pela dona Maria Araújo. “Ele estava com um uniforme impecável, usando óculos”. Feito o reconhecimento, um longo abraço e aquele beijo de toda história de amor. O casal ficou algum tempo morando em Fortaleza, voltando a Quixadá anos depois. Já na terra dos Monólitos, voltou ao seu antigo ofício de carroceiro, trabalhando por um bom tempo.

Nos desfiles da Independência, Dezinhos junto a outros quixadaenses marchavam pelas ruas de Quixadá. Todos aplaudiam aqueles que lutaram pela liberdade, democracia e pela defesa da Pátria. “Meu filho, aqueles homens deram a vida pelo Brasil”, dizia uma das mães que assistia ao evento”.

Dezinho morreu no dia 20 de setembro de 1998, deixando tristes os amigos e os filhos José Edílson, Maria Celene, Nazira, Jacinta, Aparecida, José Francisco, José Aírton, Antônio Fernando e Lúcia. Apesar de sempre se manifestar contra a guerra, Dezinho afirmava que tinham sido injustos com o Brasil, afundando submarinos nossos, matando inocentes.  Antes de morrer, nos contou que seu grande desejo em vida foi realizado, ou seja, uma prova incontestável da existência de Deus! Esta certeza tive quando voltei para o Brasil, para o meu querido Quixadá. “Ele existe sim, existe”, afirmou no último contato que teve com este repórter e amigo. Existe sim! fique sempre com ele, Dezinho!

Acessando o blog Amadeu Filho você terá a oportunidade de conhecer mais sobre a história de Quixadá.

Amadeu Filho
Colunista da RC
Radialista Profissional
Acesse também o blog Amadeu Filho

Escreva algo