A ex-secretária de educação também foi condenada, e os dois perdem a função pública.
A Justiça Federal de primeiro grau da 5ª região, subseção de Quixadá – 23ª vara, condenou o prefeito municipal, José Edmilson Gomes, e a secretária de educação, Maria de Fátima Barros Maia, a devolverem recursos do Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação – FNDE.
O Ministério Público Federal tinha movido uma Ação Civil Pública de Improbidade Administrativa por má gestão de recursos do fundo, o não cumprimento da resolução nº 17/CD/FND, compra de materiais escolares, em valores muito além do necessário, prejuízo ao erário e a culpa demonstrada.
Conforme o MPF houve desvio na compra de materiais escolares para o Programa de Educação de Jovens e Adultos – PEJA, em desconformidade com as resoluções de regência, em quantidades muito superiores às necessárias e sem o efetivo controle da entrega e distribuição do material, evidenciando culpa grave. Teria ocorrido ainda, à ausência ou o atraso na prestação de contas dos recursos recebidos, também corrobora a culpa dos réus.
Segundo o Ministério Público Federal, os réus, respectivamente, prefeito e secretária de educação do município de Ibicuitinga, manipularam o número de alunos que supostamente frequentaram os cursos relacionados ao Programa de Educação de Jovens e Adultos – PEJA, com o propósito de aumentar o valor dos repasses efetuados pela União através do Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação – FNDE.
Ainda de acordo com o Ministério Público, o FNDE repassa aos municípios o valor de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) por aluno cadastrado. No exercício de 2004, o município de Ibicuitinga informou possuir 1.024 (um mil e vinte e quatro) pessoas inseridas no PEJA, número esse 30% (trinta por cento) maior que o número de alunos matriculados e 70% (setenta por cento) maior que o número de alunos que efetivamente freqüentaram o programa. Por força do elevado número de alunos informado, o município foi contemplado com repasses no valor de R$ 256.000,00 (duzentos e cinquenta e seis mil reais).
O Ministério Público aduz que o município de Ibicuitinga gastou R$ 44.544,00 (quarenta e quatro mil, quinhentos e quarenta e quatro reais) na aquisição do kit básico para o programa, em desconformidade com a Resolução n.º 17 do FNDE.
Todavia, o município comprou itens em quantidade muito maior que a que seria necessária para atender os 1.024 (um mil e vinte e quatro) alunos informados no programa, de acordo com a seguinte tabela:
O Ministério Público afirmou na ação que apenas 708 (setecentos e oito) alunos se matricularam no programa, sendo que apenas 360 (trezentos e sessenta) cursaram-no de fato. Diz ainda que, não há quaisquer provas de que o material tenha sido de fato distribuído. Apenas, no final da gestão dos réus, nos meses de novembro e dezembro de 2004, a prefeitura elaborou documentos de controle das entregas dos kits didáticos do PEJA, os quais foram submetidos aos gestores da escola para confirmação do recebimento.
As licitações realizadas para aquisição dos kits, ainda de acordo com o Ministério Público, contêm indícios de gravíssimas irregularidades. Os convites 17/2004 e 31/2004 foram vencidos pela pessoa jurídica Maxwyano Regis Nobre Rabelo – ME – Risk Rabisk, inscrita no CNPJ sob o nº 06.143.043/0001-02 e teve como co-participante a empresa Wlyana Régia Nobre Rabelo – ME, sendo que essas duas empresas pertencem a dois irmãos (Maxwyano e Wlyana Rabelo), o que, segundo o Ministério Público, seria uma prova inconteste de que teria sido frustrado o caráter competitivo da licitação.
O Ministério Público alega, por fim, que a Controladoria Geral da União constatou que os kits foram distribuídos irregularmente a pessoas que não estavam matriculadas no PEJA. Além disso, os administradores do município teriam deixado de apresentar a regular prestação de contas referente ao exercício de 2004. Para o Ministério Público, os atos praticados estão capitulados no art. 10, incs. I, VIII e IX, da Lei 8.429/92.
O prefeito, José Edmilson Gomes, ofereceu manifestação. Em sua defesa alegou que o número de alunos matriculados no PEJA, 1.024 (um mil e vinte e quatro) alunos, foi resultado de uma campanha realizada pela prefeitura municipal junto à sociedade ibicuitinguense para que todos aqueles que estavam fora da escola se matriculassem no programa. Diz que os kits não utilizados no PEJA foram redistribuídos aos alunos da rede de ensino fundamental, bem como aos alunos do Supletivo. Afirma que, ao final do curso, o PEJA tinha 708 (setecentos e oito) alunos frequentando a sala de aula e não apenas 360 (trezentos e sessenta) como quer o Ministério Público. Aduz que os materiais foram recebidos pelos professores do programa sem qualquer questionamento.
O prefeito nega que tenha havido qualquer irregularidade no procedimento licitatório. Defende que não havia qualquer impedimento na participação das duas empresas convidadas e, invoca, como fundamento de seu argumento, o art. 9.º, da Lei 8.666/93 e o princípio constitucional da isonomia. Ao final pediu que a ação fosse rejeitada.
A secretária de educação na época, Maria de Fátima Barros Chagas, alega a incompetência absoluta da Justiça Federal para o processamento e julgamento do feito, com fundamento na Súmula 209, do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal. Quanto aos fatos e ao direito, basicamente, repete os mesmos argumentos já apresentados pelo primeiro réu. Acrescenta que a prestação de contas dos recursos recebidos em 2004 foi realizada, ao contrário do que diz o Ministério Público.
O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE requereu o ingresso no polo ativo da ação, o que foi deferido pelo juízo.
O Ministério Público Federal apresentou réplica à contestação às fls. 1005/1008. Em decisão o Juiz Federal Marcos Mairton da Silva rejeitou as preliminares de incompetência do juízo e de ilegitimidado.
Mérito
O Juiz Federal Nagibe de Melo Jorge Neto, argumentou em sua decisão que fetivamente não está demonstrado o dolo, a deliberada intenção de causar prejuízo ao erário. Mas há provas mais que suficientes de que os réus agiram com culpa grave.
“Ainda que tenha havido uma campanha maciça para a inclusão de todas as pessoas que estavam fora da escola no Programa de Educação de Jovens e Adultos – PEJA, como afirmam os réus e suas testemunhas, a medida foi desastrada”
O juiz continua em sua decisão: “Como se não bastasse pedir ao PEJA valores muito superiores aos que efetivamente deveriam ter sido gastos, os réus compraram materiais escolares em quantidades também excessivas, como qualquer administrador com o próprio dinheiro não faria”.
Parentes do prefeito
Os materiais forma adquiridos em uma licitação tipo convite, Convite nº 17/2004, da qual participaram três empresas, sendo que os titulares de duas das firmas são parentes em segundo grau, ou seja, irmãos, e a terceira é uma loja de presentes. Isso também não foi contestado pelos réus. Nas contestações, os réus alegam que não há qualquer impedimento legal à participação de empresas que tenham irmãos como titulares. “Ainda que não seja ilegal, esse é mais um elemento que aponta de modo inequívoco para o culpa dos réus. É difícil imaginar que o homem médio pesquisasse preços para qualquer serviço particular junto a empresas que tenham ou possam ter interesses comuns, que pudessem se associar em detrimento dos interesses do comprador”, destacou o MM Juiz.
Da fixação das sanções
O magistrado em sua dosimetria, disse que não há provas de que os réus sejam reincidentes na prática de atos de improbidade administrativa. O dano ocasionado aos cofres públicos, devido à má gestão dos recursos públicos foi de pelo menos R$ 35.635,20 (trinta e cinco mil, seiscentos e trinta e cinco reais e vinte centavos), o que se apresenta como um valor alto, considerando a pobreza estrutural da região. Não houve ressarcimento comprovado dos valores devidos até o presente momento.
“Tenho, pois, que deverão os réus José Edmilson Gomes e Maria de Fátima Barros Maia restituir o valor do prejuízo, de R$ 35.635,20 (trinta e cinco mil, seiscentos e trinta e cinco reais e vinte centavos), devidamente corrigido e acrescido de juros desde o evento danoso”.
Foi fixado multa no valor igual ao do prejuízo havido, R$ 35.635,20 (trinta e cinco mil, seiscentos e trinta e cinco reais e vinte centavos), contra o prefeito, em razão do cargo que exerce e da posição hierarquicamente superior que ocupava em relação à segunda ré.
Os réus ficam proibidos de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos. Também perdem a função pública, e têm seus direitos políticos suspensos pelo mesmo prazo de 5 (cinco) anos.
O prefeito e a ex-secretária de educação entraram com embargos declaratórios com efeitos modificativos.