Sertão Central: Trilhas do Vale Monumental do Ceará estão desativadas

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vale_pedras_qxbim_qxdaQuixeramobim e Quixadá estão entre os municípios que divulgam seu potencial turístico no Estado.

Quixeramobim. O projeto “Vale Monumental do Ceará”, que nasceu com o objetivo de atrair o turismo para a região do Sertão Central do Ceará, está parado. A ideia era fazer um ecoturismo em duas trilhas ecológicas, localizadas entre Quixeramobim e Quixadá, com o objetivo de gerar emprego e renda nas visitas às trilhas do Olho D´água, na localidade da Serra do Caboclo – Poço da Serra, no Distrito de Uruquê, distante 28 quilômetros da cidade, e a do Letreiro, na Fazenda Alegre, distrito-sede a 10km de Quixeramobim.

Para o presidente da ONG Instituto do Patrimônio Histórico, Cultural e Natural de Quixeramobim (Iphanaq), Ailton Brasil, na maioria das vezes, quando um gestor assume o governo, esquece os projetos que vinham sendo executados pela administração anterior. Hoje, as duas trilhas, que poderiam estar atraindo turistas, estão desativadas. “Além do prejuízo econômico com a geração de emprego e renda, vimos que os equipamentos, por estarem sem uso, correm riscos de depredações. O Brasil defende a recuperação do equipamento e que, dessa forma, se transforme numa fonte geradora de emprego e renda, além da preservação da história e memória local”.

Hotéis, restaurantes, taxistas, guias turísticos e demais que se inserem no trade turístico, sonharam com a possibilidade do crescimento dessa atividade do “Turismo Rural”, conforme prometia o mega projeto. Passados mais de uma década, nada de positivo acrescentou à ideia de alavancar a atividade numa região onde o emprego já não é tão fácil, principalmente, em época de seca. Carmelita Castor, administradora do Hotel Veredas do Sertão, conta que o local tem a capacidade de 82 leitos. Ela reclama que o negócio está dando prejuízo, face à falta de hóspede. Está atualmente com uma taxa de ocupação variando entre 30 a 40%. Nesse contexto, os turistas não vem a Quixeramobim, restando apenas os viajantes que vem a trabalho. “Se fosse incentivado o resgate dessas trilhas, certamente teríamos pessoas vindo conhecer, por se tratar de um atrativo, o ecoturismo rural”, completa Carmelita.

Enquanto isso, o agricultor Fransquinho Moraes, que reside no entorno da trilha, disse que fica muito triste em ver a Trilha do Olho D´água desativada. Segundo afirma, já teve a oportunidade de ganhar dinheiro trabalhando, tanto na manutenção dos equipamentos, bem como na condição de guia. Conta que já recebeu vários turistas, de várias partes do Brasil e até de outros países e todos saíram satisfeitos ao visitarem o local. “Como este ano a gente não fez agricultura por conta da seca, bem que esse ganho trabalhando aqui na trilha ia ajudar na compra dos mantimentos e garantir o sustento da família”, lamentou.

Recuperação dos bens

O município de Quixeramobim está promovendo um mapeamento dos equipamentos que compõem o patrimônio histórico, no sentido de preparar um plano para a recuperação e resgate do que existe de mais importante na história material e imaterial. O secretário municipal de Cultura e Turismo, Luciano Costa, reconhece que, hoje, Quixeramobim não tem condições de receber bem o turista. “Vamos fazer um trabalho de conscientização de todos para a preservação dos equipamentos, porque se o turista vier e não for bem recebido, ele não nos dará uma segunda chance. E sabemos que a melhor propaganda é aquela feita por quem esteve no lugar”, enfatiza o secretário.

Na próxima semana acontecerá em Fortaleza, na Secretaria de Turismo do Estado, uma reunião entre os dois órgãos, estadual e municipal, no sentido de reatar a parceria e, dessa forma, acontecer a injeção de recursos para a recuperação e manutenção das trilhas do turismo rural de Quixeramobim. Ele conta ainda que, até o fim do segundo semestre, terá um diagnóstico completo de toda a situação do município, para, a partir de então, propor ao chefe do Executivo local a revitalização do setor, que irá também buscar parcerias junto aos municípios vizinhos, e, se for o caso, até a formulação de um consórcio para essa área.

Beleza

Esta região é uma das belas por sua natureza. Entre os destaques, está Quixeramobim, distante 210km da Capital, colonizado a três séculos pelo português Antônio Dias Ferreira. Possuidor de uma vasta vegetação, em seus 3.579km quadrados, que compreende predominantemente a Caatinga – também denominado de mata branca, bioma único no mundo -, conta também com um rico patrimônio histórico material, composto pelos sítios arqueológicos, emoldurados pelos monólitos e suas fontes naturais de água.

Visando aproveitar esse rico potencial natural, transformando-o em possibilidades para a geração de emprego e renda com o turismo rural natural – também denominado de ecoturismo -, foi firmada parceria entres os poderes públicos, estadual e municipal, nascendo o “Vale Monumental do Ceará”. Além de Quixeramobim, contemplava o vizinho município de Quixadá. Uma das premissas do projeto visava à conservação e a preservação dos sítios, fragilizados pela ação dos vândalos.

Na década de 1990, a Secretaria Estadual de Turismo, por meio de suas políticas públicas, implantou o projeto, contando com as parcerias das prefeituras, Sebrae, além das comunidades organizadas e seus moradores, que atuavam como guias turísticos e encarregados da conservação dos equipamentos.

Quixeramobim, depois de analisadas as mais de dez sugestões para implantação do projeto, foi contemplado com duas trilhas ecológicas, a do Olho D´água, na localidade da Serra do Caboclo – Poço da Serra, no Distrito de Uruquê, distante 28 quilômetros da cidade, e a do Letreiro, na Fazenda Alegre, distrito-sede a 10 quilômetros de Quixeramobim.

Inscrição rupestre na Pedra do Letreiro

Quixeramobim. A Trilha do Letreiro pode ser alcançada depois de dez quilômetros no sentido Quixeramobim – Iguatu, pela CE-060. Na localidade de Cupim, entra à esquerda e com mais três quilômetros de terra carroçável e veredas se chega à Fazenda Alegre, às margens do riacho que leva o mesmo nome. Por entre a vegetação rala da Caatinga e alguns lajedos, está a Pedra do Letreiro, um dos sítios arqueológicos mais importantes da região. O percurso entre a ida e a volta é de 3.800 metros e leva o tempo estimado de três horas para ser completado.

Em decorrência do abandono, em meio às inscrições, também podem ser vistas ações de vândalos. Moradores e empresários solicitam que projeto seja reativado, para gerar renda para toda a região do Sertão Central.

Nesse equipamento, encontram-se documentos datados de milhares de anos, em forma de inscrições rupestres que confirmam a presença humana naquela faixa de terra. As inscrições são talhadas nas pedras que compõem o sítio, objeto de estudos de vários pesquisadores como: historiadores, antropólogos e geólogos brasileiros, e até estrangeiros já estiveram na área.

Conta o taxista Almir Fernandes que, na década de 1970, transportou um grupo de norte-americanos até o local da Pedra do Letreiro e que eles montaram acampamento e fizeram vários estudos na região.

É visível, um pouco abaixo do conjunto principal de pedras, uma lagoa que pode ter sido usada para homens e animais se refrescarem diante do forte calor que faz naquela localidade. De acordo com o historiador Marum Simão, na região da ribeira do Rio Quixeramobim habitavam os índios Quixarás, que povoaram aquela área. Nas pedras, é comum encontrar utensílios utilizados pelos nativos, como pilões de vários tamanhos, utilizados para a quebra dos alimentos e assim facilitar o cozimento. A área onde encontram-se as inscrições mede em torno de meio quilômetro, sendo entrecortada pelo riacho e os lajedos com várias formas físicas. O ponto turístico é cercado de misticismo indecifrável. O silêncio torna a trilha um ótimo local para meditação e descanso à sombra das arvores nativas.

Patrimônio histórico

A professora Marcélia Marques, doutora em Arqueologia, por meio de pesquisa de campo, identificou na trilha do Letreiro registros e documentos históricos que identificam o sítio arqueológico como um dos mais importantes no Ceará, por conta da arte rupestre esculpida nas pedras do equipamento. Ela conta que, em 2000, quando realizava pesquisa em Quixeramobim, para a sua dissertação de mestrado, esteve naquele local. Ela apresentou uma sugestão, aos órgãos responsáveis pela preservação do patrimônio, para um trabalho no sentido de proteger os sítios arqueológicos, objeto da pesquisa acadêmica.

Olho d´Água

Esse equipamento, encravado às margens do Rio Quixeramobim, acreditam os historiadores, já serviu de abrigo para o homem primitivo, que encontrava no manancial água favorável para beber, cozinhar, além do peixe, da caça e das frutas e do mel. A vegetação da região é composta por plantas nativas como o sabiá, o angico, o pau branco, o mufumbo, a jurema, a canafístula a oiticica, as bromélias e os cactos, dentre outras, que favoreciam a vida da fauna e, juntos, se somavam ao ecossistema propicio à manutenção da vida de centenas de animais hoje em extinção como o tatu, peba, o gato maracajá, tamanduá, veado, a araponga, jandaíra, sariema, a nambu, entre outras.

A Trilha do Olho D´água oferece duas opções ao visitante. A primeira mais ampliada, chega a ser radical e tem uma extensão de, aproximadamente, 5.200 metros, que compreende uma caminhada na qual se podem encontrar algumas inscrições rupestres em uma pedra às margens do Rio Quixeramobim. Depois da caminhada pela Caatinga, ao chegar ao sopé da serra, o visitante terá que escalar a pedra que mede cerca de 137 metros de altura, de forma radical ou de forma menos acentuada.

Ao chegar no cume da serra, além do clima ameno e bem ventilado, dá para se avistar de forma panorâmica a cidade de Quixeramobim e outras localidades e vilas da região dos municípios de Banabuiú e Quixadá.

No alto da serra, a natureza foi por demais generosa com a formação de uma lagoa que serve de estuário na estação do inverno, com a água se mantendo boa parte do ano, transformando-se em local de alimentação e procriação para os animais que habitam aquele lugar.

Alguns grupos de turistas também tem a opção de passarem à noite na serra para apreciar a visão noturna, além do pôr e o nascer do sol.

Com informação do Diário do Nordeste.

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