Coluna Amadeu Filho: Laranjeira, o mestre da filosofia popular

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laranjeiraJosé Rodrigues da Silva, popularmente conhecido como Laranjeira.

Ele chegou a desafiar a ciência ao afirmar que só acreditava no peso da terra (seis sextilhões, 586 quintilhões, 242 quatrilhões e 500 trilhões de toneladas) se fosse mostrada a balança com a qual ela teria sido pesada. Só acreditava que a capacidade do açude do açude Cedro é de 126 milhões de metros cúbicos, se fosse alguém provasse retirando por meio de canecas.

Laranjeira brigou feio com a imprensa esportiva do estado ao afirmar que o maior jogador do mundo fora Pacoty, seu filho (jogou no Ferroviário, Vasco da Gama e em clubes da Europa) e não Pelé, pois ele nunca foi expulso numa partida de futebol. Criou polêmica com autoridades municipais ao solicitar que, em vez de árvores na praça, deveria existir plantação de hortaliças. Desta forma, a população não precisaria comprar verduras. Era dessa forma que se manifestava sobre as diversas situações o mais famoso mestre da filosofia popular que a “Terra dos Monólitos” já conheceu: José Rodrigues da Silva, popularmente conhecido como Laranjeira. Com suas narrativas carregadas de ironia e de um humor afiado, conquistou a admiração de todas as classes sociais.

O mestre nasceu em Quixadá em 24/12/1894. Conforme nos informou o memorialista João Eudes Costa, filho de Baturité, mas a carteira do Ministério do Trabalho consta ter nascido em Quixadá. Filho de Raimundo Rodrigues e Cordolina de Lima. Casou-se em 1932 com Elfisa Nunes, nascendo desta união, Francisco Nunes Rodrigues que se tornaria um famoso jogador de futebol, conhecido como Pacoty. Do segundo casamento com Maria do Carmo, nasceram os seguintes filhos: Agenor, Josimar (ambos, jogadores), Irene, Graça e Arlene. Segundo um dos netos, Daniel Rodrigues da Silva, professor da Faculdade Católica Rainha do Sertão e presidente do Conselho Municipal de Saúde de Quixadá, seu avô era um apaixonado pelos filhos e netos, sempre dando orientações para o enfrentamento das mais diversas situações. “Morro de saudades dele”, afirmou com emoção.

Seu Laranjeira foi magarefe durante 47 anos. As pessoas se dirigiam a sua banca não apenas para comprar, mas também para ouvir narrativas folclóricas do mestre . Liduíno, que trabalha no Colégio César Cals, frequentava seu comércio, ficou muito admirado ao ouvir do mestre, disse que, quando criança, brincava pulando a Pedra do Cruzeiro, de um lado para o outro. Outro grande admirador de Laranjeira é o morador do bairro Baviera, Eudásio Carneiro. O Fã de Laranjeira disse que, ao viajar a Fortaleza, colocando sabão nos trilhos e se equilibrando num cabo de vassoura e apenas pedia para alguém dar um leve empurrão.  Eduardo Bananeira, um estudioso da filosofia popular de Laranjeira, nos relatou que, certa vez, Laranjeira chegou a duvidar da inteligência dos bancários. Não entendia como, naquele tempo acontecia muito isso, se rasgava tanto papel e colocava-os no lixo. Se o papel não tinha nenhuma importância, por que usá-los no expediente bancário? Segundo Pacoty, o seu inesquecível pai queria apenas que as pessoas ficassem felizes, era tudo brincadeira.

Aqueles que compareciam aos campos de futebol para assistir os jogos do Bangu, Comercial, Avante, chegavam mais cedo para ouvir as estórias do Mestre Laranjeira. Dedé, treinador do Bangu, antes de orientar os seus craques, fazia questão de compartilhar da mesma alegria dos torcedores. O saudoso treinador, certa vez nos contou que o “filósofo do povo” obrigava os filhos a jogar bola. Claro, isso motivado pelo sucesso de Pacoty. Os outros filhos homens, Agenor e Josimar(conhecido por Catolé) também chegaram a jogar em grandes clubes.

Ao entardecer, a sua casa na Rua Tenente Cravo, era visitada por muitos vizinhos e até pessoas residentes em outras partes da cidade. A calçada com muitas cadeiras, mais parecia um pequeno auditório. Todos queriam escutar as últimas do Mestre, não apenas ouvir estórias, também se alimentar de otimismo e de muita alegria, fortes características de Laranjeira. Otimismo mostrado com mais intensidade, por ocasião dos festejos do seu centésimo aniversário quando, para admiração de todos, declarou querer viver 200 anos.

E encantou os presentes cantando “sertaneja”, famosa canção gravada por Orlando Silva. Ao seu aniversário compareceram não só o “povão”, mas também diversas autoridades do município e do estado. Claro que não realizaria seu sonho de viver o tempo desejado, mas sua doce figura, suas tiradas irônicas ficarão para sempre guardadas e protegidas por esses belos Monólitos que nos abraçam o tempo todo.

O grande filósofo popular fez a grande viagem em 15/09/1996, já com quase 102 anos de idade. Divulgar nomes como o de Laranjeira é uma forma de manter de pé as pilastras mestres de nossa História. Certo está o memorialista João Eudes Costa ao afirmar que um povo que não tem zelo pela sua cultura, não existe. Não pode jamais mostrar o seu valor sem o registro do passado.

Viva o Mestre Laranjeira! Viva!

*Nota do autor do texto: A História não é definitiva! Novas informações podem ser acrescidas! Ela se faz com várias mãos.

Acessando o blog Amadeu Filho você terá a oportunidade de conhecer mais sobre a história de Quixadá.

Amadeu Filho
Colunista da RC
Radialista Profissional
Acesse também o blog Amadeu Filho

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